"Para existir grandes escritores, devem existir grandes espectadores também."

terça-feira, junho 15

Às segundas-feiras



Às segundas-feiras ele esperava o café, o jornal, e o relógio. Mísero objeto que governa vidas, que constrói e destrói, ainda que só caminha em círculos. Mas em uma dessas segundas-feiras, algo mudou. Mais do que as fotos e as barbaridades estampadas na primeira página.
Havia um garoto, minutos depois que sentou no seu lugar de sempre, e este carregara um papel em mãos. O papel era algo que ele, o cara das segundas-feiras havia escrito. Algo que ele, o cara das segundas-feiras deixara por aí, sem esperanças que alguém desse atenção à suas palavras.

Dizia ele, o cara das segundas-feiras, que o mundo só se preocupava com três coisas: Os relógios, os jornais e os cafés. Diferente dele, que mantia aquela postura por costume. Rotulara costume como lixo contemporânio. Lixo, era o que ninguém se importava, aos olhos dele. O mundo acabaria assim, desde o primeiro até o último, todos, atolados no próprio lixo.

O garoto então se aproximara, cantarolando algo sobres as esperanças perdidas, aquelas do cara das segundas-feiras, as que estavam perdidas por aí, crentes da indiferença.

O escritor de gaveta, incrédulo diante dos elogios, vacilou sem sequer quebrar o tom sereno da varrida de olhos que consumia o jornal:
- Metade do que escrevo é lixo.
Mas a persistencia veio à tona, e assim como quem persiste, venceu.
- Então qual é a metade boa? - perguntou com aquela esperança nos olhos, na alma.

Foi nesse momento, somente nesse momento, que os olhos do escritor fixaram algo despercebido, perdido dente as linhas apertadas do jornal. Disfarçando seu interesse, vasculhou em segredo a imagem do garoto. Tomou o ultimo gole de café e respondeu com indiferença mórbida.
- Depende. Virá me perguntar novamente amanha? Se vier, considere os lixo, todos lixo, sem nenhuma excessão. - Depois de uma breve pausa, acrescentou - Todos. Sem excessão.
Ávido de curiosidade - ou de frustração, tentou novamente o tal garoto, sem ao menos ter ideia que havia desfeito a rotina do escritor. Parecia, até aquele momento, apenas ter alterado-a.
- Se tudo é lixo, aonde ficam as metades?

O garoto não obteve mais respostas. Não obteve sequer uma expressão convidativa ou restritiva - antes havera. Simplesmente fora deixado ali, e depois, tampouco quis saber de tudo. Saber o final da conversa, ou o inicio da resposta.
Havia entendido aonde as metades cabiam.
As metades cabiam nas explicações, nas crenças, na fé.
Sabedoria requer limitação, e quem muito se questiona, é por já não querer acreditar.
Aquela segunda-feira tornou-se eterna por ser a última. A última do café, do jornal e do relógio.

6 comentários:

  1. mayara van bell é estilo, é beleza e acima de tudo uma inteligencia quase que insana

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  2. mayara van bell é estilo , é beleza e acima de tudo uma inteligencia quase que insana , que faz os olhos de quem vê , brilharem. Quem lê seus textos , ficam admirados com as mensagens marcantes que você passa. Parabéns.

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  3. Obrigada amores♥

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  4. Um verdadeiro texto. Uma bela obra. May Van Bell é um estilo de vida.

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  5. ''Depende. Virá me perguntar novamente amanha? Se vier, considere os lixo, todos lixo, sem nenhuma excessão.'' isso mostra o quanto as pessoas mudam de opniao frequentemente.Otimo texto,admirável

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